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A inserção brasileira no cenário do comércio internacional, depois de anos de um quase isolamento comercial, é um processo que só começou no início da década de 90. A proteção excessiva à produção doméstica havia induzido o país a um sistema de economia fechado, autárquico, distorcendo os processos de alocação de recursos e desestimulando a concorrência em benefício da sobrevivência de agentes de menor eficiência. Essa situação obrigou a criação de instrumentos de controle de preços que deprimiram a rentabilidade e desestimularam a expansão da oferta em muitos setores. Subsídios e incentivos, sobretudo à exportação, foram criados então para compensar os maiores custos dos insumos domésticos.

A sociedade viu-se, como decorrência desse protecionismo, diante de uma oferta limitada, pouco diversificada, de preço elevado, que reduziu o poder de compra de seu salário e, por essa via, reduziu o tamanho do mercado interno, fazendo escassear as oportunidades de investimento. Apenas com a eliminação parcial dos chamados regimes especiais de importação e a redução da redundância tarifária, em 1988, complementadas, em 1990, pela reforma da Lei de Tarifas e mediante a instituição de um regime cambial de mercado é que se começa a construção de novos paradigmas para a inserção brasileira na economia mundial, acompanhados dos temores a eles associados.
Talvez se possam assumir esses eventos e essas datas como os marcos iniciais do reconhecimento do estado de transformações pelo qual os mercados haviam passado, e que estavam a exigir da empresa nacional a competência em adequar suas ofertas aos mercados que pretendessem servir. A competitividade se agravara, sobretudo, como decorrência dos processos globalizadores, que reconfiguraram a produção e a distribuição, a partir de três grandes movimentos, todos com reflexos claros sobre a estrutura teórica e prática do comércio internacional:

1º) A unificação da infra-estrutura produtiva e do desenvolvimento tecnológico

Em torno de três pólos mundiais (União Européia, NAFTA e o Bloco do Yen) gravita um processo continuado de globalização da economia mundial, cuja vertente mais ativa localiza-se na unificação dos processos produtivos através das atividades de global sourcing, das novas metodologias de produção, de alianças estratégicas entre fornecedores e fabricantes ou de formas inovadoras de parcerias estabelecidas desde o desenvolvimento de novos produtos até sua efetiva produção.
A lógica aqui é a dos custos. São eles que definem a distribuição geográfica da produção mundial, determinando a cada país, pelas vantagens competitivas e comparativas que apresenta, a produção dos diferentes bens e serviços que compõem os elos das cadeias produtivas. Cresce, por isso, dentro do comércio mundial, a parcela correspondente às trocas internas entre grupos econômicos e corporações.

2º) A integração dos mercados

A Rodada Uruguai do GATT (hoje, Organização Mundial do Comércio - OMC), sinalizou para mais de 110 países ali reunidos, as normas de formação de um mercado unificado para mercadorias, serviços e fatores de produção, com um mínimo de discriminação associada à origem geográfica de produtores e consumidores. A celebração dos acordos de Marrakesh e, depois, a reunião de Cingapura, testemunham a existência de um mundo empenhado em proceder, de forma crescente, à liberalização dos fluxos de comércio e de investimentos. Com isso, os esforços de harmonização internacional tornaram-se inevitáveis. As leis e instituições, mesmo de países de distintos ordenamentos jurídicos, passam a convergir em matéria de serviços, propriedade intelectual, competição, meio ambiente, padrões de produtos e investimentos.

É nesse contexto de regionalização / globalização dos mercados que deve ser entendida a participação de cada nação em blocos regionais, realizando a nova vocação multilateral do comércio mundial, reduzindo os efeitos perversos que as alternativas regionais fechadas exercem de forma discriminatória sobre os influxos de capitais e sobre o acesso às tecnologias de vanguarda.

3º) Tendência à concentração do capital internacional

Arredio ao risco, o capital internacional procura gravitar em torno das áreas de maior potencial de geração de riquezas. Assim, os últimos anos registram uma expressiva concentração no fluxo em torno de três áreas: Estados Unidos, União Européia e Japão. Financiam o comércio, amparam a produção e colocam-se disponíveis para os centros mais dinâmicos da vida econômica, deslocando-se apenas ocasionalmente para as regiões periféricas do mundo.

Por fim, o capital internacional, atraído pela remuneração que o avanço tecnológico pode promover, disponibiliza-se para as atividades de Pesquisa e Desenvolvimento e para as de Ciência e Tecnologia.

O seu retorno estará garantido pela comercialização, em nível mundial, dos produtos do empreendimento inovador. Porque economicamente poderosos, os capitais fluem para essas regiões retroalimentando-as pela sua concentração e pela hegemonia tecnológica dela decorrente.

 

A globalização e os novos relacionamentos internacionais


Causa ou conseqüência de tantas transformações, o fato é que a globalização se imbrica com o conjunto dessas mudanças, ocorridas sempre no bojo das relações existentes entre fabricantes-fornecedores-distribuidores. Uma verdadeira revolução nas formas de produzir e distribuir, que desemboca em novos modelos gerenciais, agora supondo capacidades de ofertar quantitativamente superior às de consumir. A produção massiva, reorganizada a partir dos pressupostos globalizantes, comprometidos com custos substancialmente menores, pede a redução dos preços finais e das respectivas margens de contribuição para viabilizar o consumo massivo.

Os lucros devem, então, derivar dos volumes, e isso impõe à, administração, objetivos voltados à conquista de novos mercados, em qualquer parte do mundo, aumentando o número de consumidores e à fidelização dos atuais clientes, para o aumento de suas respectivas taxas de uso. A estratégia geral para isso reflete o ambiente descrito e a natureza dos objetivos explicitados: ganhos de share, em todo os mercados, sejam locais ou internacionais, mesmo com sacrifício das taxas de remuneração dos capitais investidos.

Foram essas relações de fornecimento-fabricação-distribuição que ensejaram o surgimento do esforço de relacionamento para ampliação das fronteiras comerciais. Neste novo ambiente, a organização é tão mais competitiva quanto mais competitiva for sua cadeia produtiva, seu preço será tanto menor e sua qualidade tanto maior, quanto mais sadias forem as interações havidas entre os elos da cadeia. Integrar recursos, pessoas, estruturas, processos, culturas, sistemas, tecnologias é a maneira de tornar toda cadeia competitivamente mais robusta.

Há, portanto, a necessidade de entender, interagir, compartilhar, contribuir para que todos possam ganhar. O ganho de cada um se faz pelo atendimento das necessidades e dos desejos de todos os outros. Não era mesmo de se conceber que dentro de um processo ativo de global sourcing, praticado pelo fabricante, os fornecedores se mantivessem passivos, à mercê do acaso, na seleção de pedidos com dimensões mundiais. Naturalmente, essa situação sugeria novos e mais criativos esforços para obtenção de pedidos tão atraentes, até porque não obtê-los poderia significar, para o fornecedor preterido, a inviabilidade de suas operações industriais.

As atividades de co-design, tornando a inovação um processo muitas vezes compartilhado física e financeiramente, fez das interações havidas um campo fértil para a prática do comércio internacional. O exercício dos procedimentos envolvendo o conceito de robust design ensejou o desenvolvimento e ampliação de mecanismos fidelizadores.

A engenharia simultânea, finalmente – para não cogitar do consórcio modular –, estreitou vínculos comerciais, ampliou a capacidade de compreensão das necessidades e desejos do cliente industrial e de outros elos da mesma cadeia, ensejou parcerias variadas, ampliou de forma mútua e recíproca a dependência de cada um em relação a cada outro, obrigou ao aperfeiçoamento da prestação de serviços no pré e nos pós-venda, solicitou a cooperação técnica, enfim, realizou de forma plena e cabal o próprio conceito de livre-comércio.

Até então esse conceito não havia, mesmo nas trocas entre países ricos, alcançado a si mesmo de forma tão exuberante e completa. Ei-lo agora realizado, com olhos e objetivos no consumidor mundial, mas ironicamente, longe dele, dentro das fábricas, dos veículos transportadores, e dos, cada vez mais raros, depósitos intermediários. Pensando em processos e métodos, em modelos gerenciais e na construção de habilidades organizacionais capazes de produzir oferta de qualidade, a custos reduzidos, o comércio em nível internacional hipertrofia, a partir desses momentos, os estudos sobre o comportamento do consumidor mundial, suas decisões relativas ao ato de compra e suas formas de processamento de informações.

Esse quadro, tal como descrito, impõe o novo desafi como transformar as empresas locais em empresas que possam competitivamente atuar no mercado internacional? Como compreender as novas ameaças e as novas oportunidades presentes nesse ambiente? Que modelos ou teorias poderiam socorrer os profissionais, sobretudo os de comércio internacional, envolvidos com essa tarefa?

A teoria de economia internacional em muito auxilia nas respostas a essas questões, sobretudo, porque oferece explicações bastante robustas sobre as transformações que o comércio exterior de um país atravessa, quando abandona os paradigmas de uma economia fechada - uma autarquia -, para transformar-se em uma economia aberta. Se, de um lado, essa teoria dá suporte à formulação da política econômica, de outro, sinaliza com clareza ao administrador, para novas transformações com as quais terá de conviver no novo cenário.

Emoldurado por esses elementos, o desempenho do comércio exterior brasileiro passa a decorrer, em larga medida, da globalização da infra-estrutura e dos processos de produção e pesquisa nacionais, da expansão da escala de nossas atividades de distribuição para os níveis pressupostos pelos mercados regionalizados e, finalmente, de nossa capacidade de acessar recursos, de longo prazo, a custos competitivos.

Abre-se, com isso, uma ampla oportunidade para o desenvolvimento de estudos e trabalhos de assistência e capacitação nesta área, capazes de fornecer os subsídios, teóricos e aplicados, aos agentes públicos e privados envolvidos com a problemática da expansão do comércio internacional brasileiro. Estas são razões que levaram à criação do Programa de Comércio Exterior Brasileiro – PROCEB-FIA.